quarta-feira, 7 de março de 2012

CULPABILIDADE POR VULNERABILIDADE - ZAFFARONI

Caros alunos, amanhã enviarei o texto do Prof. Zaffaroni sobre “culpabilidade por vulnerabilidade” (EM BUSCA DAS PENAS PERDIDAS), conforme prometido.

Todavia, como esta matéria será revisitada quando da aplicação da pena, quero apenas esclarecer um ponto relevante, a fim de evitar incompreensões:

(i) Zaffaroni trabalha com duas culpabilidades: a pelo “fato” (tradicional) e a por “vulnerabilidade”. A culpabilidade pelo fato é o fundamento e o limite MÁXIMO da pena. A culpabilidade por vulnerabilidade atua sempre de modo a, ou REDUZIR esse limite máximo (situação concreta de vulnerabilidade), ou MANTÊ-LO igual (esforço pessoal para tornar-se vulnerável). Nunca poderá majorar esse limite, pois isso violaria o próprio princípio constitucional da culpabilidade.

(ii) Digamos que a culpabilidade pelo fato seja representada pelo grau “0”. O máximo que um juiz criminal poderá fazer é, tendo em conta a situação de vulnerabilidade do agente, reduzir esse patamar para -1, -2 etc. Caso não se verifique a situação de vulnerabilidade ao sistema penal, ou caso uma pessoa não vulnerável ao sistema penal tenha realizado ainda assim o delito, o patamar correspondente à sua culpabilidade permanecerá igual (grau “0”), ou seja, não será majorada nem diminuído.

(ii) Conclusivamente, a culpabilidade por "vulnerabilidade" não viola o limite máximo da pena, atuando apenas como corretor de desigualdades fáticas (diferente condições pessoais do agente e seletividade do sistema na criminalização) ignoradas pelo direito penal.

A seguir, trecho em que Zaffaroni expõe resumidamente essa distinção (ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Hacia un realismo marginal. Caracas: Monte Avila Latinoamericana, 1992,  p. 110.)

   “A quantificação penal reconheceria como limite máximo a culpabilidade do ato, porém não explicitamos com isso o corretivo fático que permitiria estabelecer penas por debaixo de esse limite. A nosso juízo, isto pode praticar-se a partir da vulnerabilidade que a pessoa oferece ao exercício do poder punitivo. É um dado da realidade que quanto maior é o esforço que uma pessoa há feito para fazer-se vulnerável ao exercício do poder punitivo, menor será o espaço da agência judicial para baixar a pena do limite assinalado pela culpabilidade e vice-versa.
Deste modo, a quantificação penal, consistente sempre na tarefa de impor a pena menos violenta possível, colocaria um limite máximo (magnitude «0») que estaria dado pela culpabilidade do ato. O espaço de poder da agência judicial para quantificar a pena por debaixo desse limite (magnitude «-1», «-2», etc.) dependerá sempre do esforço que haja feito a pessoa para alcançar a situação de vulnerabilidade em que o há surpreendido o poder punitivo, esforço de que formará parte a magnitude do conteúdo do injusto, entre outros dados (caracteres pessoais que correspondam ao estereótipo, por exemplo).
  Uma pessoa cujas características pessoais coincidam com as do estereótipo criminal, basta com que incorra em um injusto leve para que seja vulnerável. Por regra geral, a vulnerabilidade alcançada com pouco esforço [como no caso do pequeno traficante] concede à agência judicial um espaço de poder muito considerável para impor penas mínimas ou muito leves, sem que as agências restantes do poder punitivo tenham argumentos ou elementos para criticá-la ou desprestigiá-la. Inversamente, ante a esforços muito grandes [como no caso de um poderoso político que participe de uma rede de pedofilia], a agência judicial carece de poder para proceder de igual forma.
  Partindo do principio de que a pena mais leve é a menos violenta, a agência judicial tem poder no primeiro caso para baixar a magnitudes -1, -2 etc., mas não pode fazê-lo no segundo, sob pena de sofrer desprestígio, críticas e perda de poder, caso em que não lhe restará outro meio que manter-se na magnitude «0» (indicada pela culpabilidade do ato).”

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